Os trechos a seguir foram retirados do Capítulo XII do livro Maha Yoga, que já foi traduzido pelo Prof. Hermógenes e publicado no Brazil na década de 1950. Fizemos uma nova tradução do texto e há possibilidade de publicação em 2011. Os trechos abaixo são provenientes da nova tradução. Em negrito são os subtítulos colocados pelo autor (K. Lakshmana Sarma) e, entre aspas, os ensinamentos do Maharshi.
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COMO CONCILIAR AS IDEIAS DISCORDANTES DE HOMENS DE DIFERENTES RELIGIÕES? “O objetivo real de todas as religiões é conduzir ao despertar para a Verdade do Ser. Mas a Verdade do Ser é simples demais para a maioria das pessoas. Embora não exista ninguém que não tenha conhecimento do Ser, as pessoas não se interessam em ouvir falar d’Ele. Julgam que o Ser é de pouco valor. Querem saber de coisas remotas – do céu e do inferno, da reencarnação, e assim por diante. Amam o mistério, e não a verdade plena. E as religiões se adaptam a elas, para que, no final das contas, elas possam voltar ao Ser. Mas por que não procurar encontrar o Ser e habitar Nele imediatamente, sem maiores divagações? Os céus não podem estar separados daquele que os vê ou neles pensa: sua realidade é do mesmo grau que a do ego que deseja chegar até eles; portanto, os céus não existem separados do Ser, que é o céu verdadeiro.
“Um cristão não ficaria satisfeito a menos que lhe disséssemos que Deus está em algum céu distante, que ele não pode alcançar sem auxílio divino; que somente Cristo conheceu Deus e apenas ele pode levar os homens até Deus. Se lhe disséssemos que “o Reino dos Céus está dentro de você”, ele não entenderia o sentido simples dessa afirmação, mas iria buscar interpretações complexas e artificiais. Somente o espírito maduro pode compreender e aceitar a verdade simples e nua.
“A divergência entre ensinamentos é apenas aparente, e pode ser resolvida se praticarmos a autoentrega, rendendo-nos a Deus; isso conduzirá ao Ser, ao qual todos voltarão no final, porque Ele é a Verdade. A discordância entre os credos nunca será vencida através do debate de seus méritos, já que o debate é um processo mental. As crenças são mentais – existem apenas na mente, enquanto que a Verdade está além da mente. Portanto, a Verdade não está nos credos.” Por conseguinte não devemos ter muito estima pelos nossos credos.
“O conhecimento sagrado é volumoso, suas diferentes partes adaptando-se às necessidades das diversas espécies de buscadores. Cada buscador sucessivamente transcende porção após porção; aquilo que ele transcende torna-se, então, inútil e até mesmo falso para ele. Por fim, ele o transcende integralmente.”
PECADO ORIGINAL. Certa vez perguntaram ao Sábio sobre a doutrina cristã do “pecado original” – segundo a qual todo homem nasce em pecado e só se liberta pela fé em Jesus Cristo. O Maharshi respondeu: “Diz-se que o pecado está no homem, mas não há existência humana no sono; a existência humana surge ao acordar, junto com o pensamento: ‘Eu sou este corpo’. Este pensamento é o verdadeiro pecado original e deve ser removido pela morte do ego, depois da qual não mais surgirá.” E explicou a verdade do cristianismo da seguinte maneira: “O corpo é a cruz; o ego é Jesus, o filho do homem quando é crucificado, e que ressurge como ‘Filho de Deus’, que é o glorioso Eu Real. Devemos perder o ego a fim de viver”. Podemos lembrar aqui que, de acordo com todos os sábios, a vida do ego não é verdadeiramente vida, mas morte.
HÁ CONHECIMENTO DO SER NO ESTADO SEM EGO? A verdade sobre o Estado sem ego é transmitida pelo Sábio por meio de negações. “O que se chama Conhecimento do Ser é aquele Estado em que nem pode haver conhecimento nem ignorância, pois o que é comumente considerado conhecimento não é verdadeiro conhecimento[1]. O Ser é por si só o verdadeiro Conhecimento, porque brilha por si só – sem nada que possa se tornar objeto de Seu conhecimento ou que possa conhecê-Lo. Devemos compreender que o Ser não é o vácuo.” [2] Como o Estado sem ego não é descrito para nós em termos positivos, muita gente está sujeita a concluir que não passa de um simples nada ou total aniquilação. Tal erro foi cometido por muitos pretensos seguidores do Iluminado Gautama Buda. Nesse ponto, o Sábio Ramana se acautela para que erro similar não seja feito por aqueles que venham a tornar-se seus discípulos, declarando que esse Estado não é um vácuo.
Uma vez que o Sábio está num plano onde não há ignorância nem conhecimento, ele não tem necessidade de apreender coisa alguma. Nem as escrituras sagradas lhe interessam, embora ele as possa ler a fim de explicar seu verdadeiro significado a quem lhe perguntar sobre isso. Assim, podemos compreender a seguinte declaração: “Até mesmo um homem culto deve curvar-se diante de um Sábio analfabeto. O homem analfabeto é simplesmente ignorante. O homem culto é um ignorante com cultura. O Sábio também é ignorante, porque nada existe para ele aprender.”
DESTINO OU LIVRE-ARBÍTRIO: QUAL DETERMINA A NOSSA VIDA? Quem formula essa pergunta espera uma resposta categórica. Deseja saber qual dos dois é o fator decisivo na vida – o destino ou o livre-arbítrio. Em suas obras, o Sábio responde assim: “O debate quanto a qual dos dois – destino ou vontade humana – é mais poderoso, interessa apenas àqueles que ainda não têm iluminação sobre a verdadeira natureza do ego, do qual surgem essas duas ideias. Aquele que tem esclarecimento sobre isso transcendeu ambos e já não se interessa pela questão”[3].
A um visitante que lhe formulou essa pergunta, o Sábio respondeu: “A resposta a essa pergunta, se eu a desse, seria um tanto difícil de ser compreendida. Contudo, quase todos fazem essa pergunta em algum momento na sua vida. Devemos conhecer a verdade daquele que parece ser afetado, ou não, pelo destino.” Nesse ponto o Sábio evidentemente quis dizer o ego. Como a distinção entre o destino e o livre-arbítrio existe somente para o ego-mente, a verdade da questão é inseparável da verdade sobre o ego, a qual só pode ser compreendida através da Busca. Tendo dito isso, o Sábio continuou explicando o significado real do destino: “O destino tem um começo – uma causa – e essa é a ação, a qual não existe sem livre-arbítrio. Portanto, como o livre-arbítrio é a causa primeira, ele é o fator predominante, e educando o livre-arbítrio podemos conquistar o destino.” Educar o livre-arbítrio significa tomar o processo de autoinvestigação – a Busca ensinada pelo Sábio – ou, alternativamente, entregar-se a Deus enquanto Realidade Única. “O que normalmente se denota por autoconfiança nada mais é do que a confiança no ego, o que fortalece a prisão. Apenas a confiança em Deus é a verdadeira Autoconfiança, porque Deus é o Ser [Eu Real].”
É NECESSÁRIO TER UM GURU? É uma crença comum entre aqueles que tem tendências espirituais que todos que aspiram ao estado de libertação devem no tempo devido encontrar um Guru e apegar-se a ele. Alguém perguntou ao Sábio quanto à validade desta crença. A resposta foi a seguinte: “Enquanto alguém se julgar pequeno – laghu – deve apegar-se ao grande – o Guru. Ele não deve, no entanto, considerar o Guru como uma pessoa. O Sábio é apenas o Eu Real do discípulo. Quando esse Eu Real é alcançado não existe nem Guru nem discípulo.” Essa pergunta surgiu porque o próprio Sábio não teve Guru – pelo menos nenhum Guru exterior. Em outra ocasião o Sábio disse: “Seria necessário um mestre, se alguém precisasse aprender algo novo; mas o caso aqui é desaprender.”
COMO SUPERAR AS PREOCUPAÇÕES DA VIDA? Um visitante disse: “Estou sujeito a preocupações sem fim. Para mim não existe paz, embora nada me falte para ser feliz.” O Sábio perguntou: “Essas preocupações o afetam quando você está dormindo?” O visitante admitiu que não. O Sábio lhe fez outra pergunta: “Você é o mesmo homem, ou é diferente daquele que dormiu sem preocupações?” “Sim, eu sou a mesma pessoa.” O Sábio disse: “Então, certamente, essas preocupações não lhe são inerentes. A culpa é sua se você supõe que elas são suas.”
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